Colcha de retalhos
Para Elis
Se pudessem ver o rosto
do coração de Elis,
veriam que é uma colcha de retalhos.
De diferentes estampas e diferentes texturas,
como são, de fato, todos os cortes
depois de cicatrizados.
Uma colcha de retalhos construída
paulatinamente,
alinhavada com música,
silêncio
e o susto do reconhecimento.
Coração colcha de retalhos,
generosidade de tecido,
medicina contemplativa
dos cortes em mim abertos
pelas minhas próprias mãos.
Coração agulha e linha,
tessitura fina e desigual,
feminina, em ponto crescente,
alinhava rasgos e precipícios
como uma índia antiga
macerando plantas:
madrugada na aldeia.
Alinhava rasgos e precipícios
como uma aldeã que faz o pão
e, com ele,
mata a fome dos homens
e abranda suas discórdias.
Retalhos de Penélope
tecidos a cada espera.
Fruto do tear noturno
em que a trama do mundo
é desenhada em silêncio,
nas mãos das mulheres insones.
Colcha de retalhos,
coração de Elis.
E o mundo não precisa mais chorar
nem morrer encolhido, com frio.