sexta-feira, junho 03, 2011

Cíclico


Comovo-me com as menores coisas boas. Com gentilezas ridículas, risíveis, subatômicas. Eu, só eu, planto estrelas em lugares insignificantes, como quem semeia trigo em meio a um monte de pedras. Planto metáforas onde tudo é racional e árido. Nunca colhi nada, até agora...

É como se uma estranha maldição condenasse tudo a fenecer. Desde que ouvi as palavras encantatórias, tornei-me uma criatura sonambúlica que lhes obedece às ordens. E eis que uma estranha pulsão de morte se apossou de meus gestos, e meu trabalho tem sido apenas encaminhar as coisas ao seu final. Tudo o que toco, conduzo ao momento derradeiro. Como uma minúscula formiga operária cujo trabalho é abrir discretos túneis que levam ao precipício. Só ajo porque existe o fim. Se semeio um campo inteiro de trigo, é apenas para entregá-lo à sanha dos gafanhotos. Se escrevo quilométricos tratados, o faço com a finalidade exclusiva de que sirvam de alimento às traças.

Não ouso lamentar por nada. Apenas me entrego ao ciclo fundamental de vida-morte-vida que rege o mundo. Caem as folhas secas, e encravam-se em meu peito, decompondo-se em matéria úmida que há de fertilizar minha carne. Algo nascerá, nem que seja uma planta minúscula e raquítica, que alimentará as lagartas. E haverá algo de mim nas borboletas em que estas se transformarão.

Quando eu puder voar com elas, entenderei o que leva os seres a partir.

Salaam

Layla