terça-feira, junho 20, 2006

Sobre o Inefável; sobre a Dança















Há tempos eu não falava aqui sobre dança do ventre. Falar sobre dança me é estranho. É como se o exercício da metalinguagem fosse desnecessário: como hei de falar daquilo que sou? Se pudesse explicar em palavras o que sinto, não dançaria, ouvi certa vez. Agora estamos aqui, eu e as palavras, e a necessidade de traduzir o intraduzível: o que é, para mim, esta coisa de dançar.

Dança do ventre, para mim, sempre foi sinônimo de “celebração”: celebrar a alegria e a intensidade da vida, a felicidade de ser mulher e sentir-se bem como tal. É um contato com nossas origens mais longínquas e ancestrais, que nos traz um nítido bem-estar. Um contato com o núcleo primevo e instintivo que temos dentro de nós, com nossa “mulher selvagem”, como sabiamente apontou Clarrisa Pinkola Estés.

O ato de dançar não é só bonito, é lúdico e terapêutico. Coloca-nos em contato com nossos abismos, com o que há de mais belo e de mais assustador em nossas profundezas. É, portanto, exercício de auto-conhecimento: descobrindo-se, a mulher se aceita e se valoriza, tornando-se, desta forma, mais forte e mais segura.

O que é esta felicidade que me acomete enquanto danço? – pensei um dia. Ainda busco respostas, mas é inútil: é impossível responder racionalmente a esta questão. Creio que seja a felicidade de “ser mulher”. Termo batido, já banalizado pela obviedade dos discursos modernos, mas não consigo recorrer a outro que expresse esta idéia melhor. Ser mulher é uma experiência indescritível, e é dançando que a vivencio de forma plena. O que há nesta dança que tem este estranho poder? Ainda não sei. Mas é algo capaz de conectar a dona de casa do século XXI com a camponesa da antigüidade egípcia, com a sacerdotisa que dançava para Ísis ou Bastet. É um fio que une todas nós, deslocadas no tempo e no espaço: a professora de História de hoje, com a grega que colhia trigo, com a babilônica que dava à luz, com a fenícia que fazia potes de barro. A dança celebra a maternidade, a fecundidade, e isto implica dizer que ela se relaciona à todas as mulheres que já existiram. Haverá, portanto, melhor meio de congregação entre nós?

Congregar, alegrar, vivenciar, ensinar, aprender, existir. Este para mim é o sentido desta Arte. Acrescento também o verbo resistir, é claro. Verbo no qual, muitas vezes, tem se resumido a história de nossa existência – a existência de todas nós, mulheres – neste mundo que nos abriga. Nossa história tem sido a história da perseguição, da mutilação, do emudecimento, da obliteração, do esquecimento. Nossa história é a história da resistência: em meio ao sal desse mundo, amorfo, normopata e descomprometido com os valores femininos – a emoção, a intuição, o sentimento – continuamos brotando como flores, parindo nossos filhos, dando-lhes de comer, dando-lhes de viver. E dançando. Rejeitando o cinza, e semeando vida. A dança acompanha nossa história. Acompanha a cigana que ganha a vida rodopiando, acompanha a beduína que se prepara para trazer um novo filho ao mundo, acompanha a menina recém-menstruada na tribo. Acompanha, hoje, a mulher moderna que, para não se perder de si, busca nas ancestrais essa força.

É por isto que a dança é parte dessa resistência. Continuamos doendo, mas continuamos dançando. “Como insulto. Como resposta. Como centelha do viver”, como diria Clarice Lispector. Como um golpe de otimismo, avassalador como um sorriso inesperado, que nos faz fechar os olhos, felizes.

Salaam
Layla

Foto: "Zaar", Cia. Rhamza Alli de Danças Árabes, 2001. O Zaar é uma dança de transe levado à exaustão. Baseia-se em antigos rituais do sul do Egito, e consiste numa dança circular marcada por um ritmo forte, de duas notas, que pulsa como o coração. Tive a felicidade de dançá-lo: eu sou a do meio da foto.

14 Pitacos:

Blogger Carlota e a Turmalina falou...

Oi lindona
Falando em celebração dizem que este ano o Solstício do Inverno ocorrerá no dia 21 de junho. Aqui iremos celebrá-lo no dia 24, sábado, em torno da fogueira como todo bom São João...
E na tradição celta é quando a natureza volta-se para si mesma!
Beijos

6/20/2006 04:00:00 AM  
Anonymous Anônimo falou...

Dança do ventre é bem legal. Eu gosto muito. Boa semana. Beijos

6/20/2006 03:11:00 PM  
Blogger Najha Mandisa falou...

A Dança do Ventre para mim é uma PAIXÃO!
Adorei seu blog!
Beijos no coração!
Najha

6/22/2006 10:43:00 AM  
Anonymous Anônimo falou...

JAMAIS PERMITA

Jamais permita que algum homem te escravize,
você nasceu livre para amar,e não para ser escrava.
Jamais permita que o teu coração sofra
em nome do amor,
amar é um ato de felicidade, por que sofrer?

Jamais permita que teus olhos derramem lágrimas,
por alguém que nunca te fará sorrir!
Jamais permita que teu corpo seja usado,
saiba que o teu corpo é a moradia do espírito,
por que mantê-lo aprisionado?

Jamais permita ficar horas esperando por alguém,
que nunca virá, mesmo tendo prometido!
Jamais permita que o teu nome seja pronunciado
em vão por um homem que nem sabe se tem nome!

Jamais permita que o teu tempo seja desperdiçado,
por alguém que nunca terá tempo para você!
Jamais permita ouvir gritos em teus ouvidos,
o amor é o único que pode falar mais alto!
Jamais permita que paixões desenfreadas,
tirem você de um mundo real,
para outro que nunca existiu!

Jamais permita que os outros sonhos
se misturem aos seus,
fazendo os virar um grande pesadelo!
Jamais acredite que alguém possa voltar,
quando nunca esteve presente!

Jamais permita emprestar teu útero,
para gerar um filho que nunca terá um pai!
Jamais permita viver na dependência de um homem,
fazendo crer que você nasceu inválida!

Jamais permita que você fique linda e maravilhosa,
para esperar um homem que não tenha
olhos para te admirar!
Jamais permita que teus pés caminhem em direção
de um homem, que só vive fugindo de você!

Jamais permita que a dor, que a tristeza, que a solidão,
que o ódio, que o ressentimento, que o ciúme,
que o remorso, e tudo que possa tirar o brilho
dos teus olhos,fazendo enfraquecer a força
que existe dentro de você!

Jamais permita que você
mesma perca a dignidade de ser
MULHER!!!

Desconheço a autoria

6/24/2006 04:48:00 PM  
Anonymous Anônimo falou...

Layla, não consigo mais dançar, algo em mim travou e abandonei a dança por aqui. Um dos motivos é a falta de profissionalismo das capixabas, eu não tolero. Acho q vou pegar umas fitas e tentar sozinha. Mas algo está faltando e não sei ainda o que é. Mas lendo vc, uma pontinha de coragem e stá me cercando. Obrigada por tudo o que vc representa pra mim. Vc é vida!

Bjos!

Iony, A Ionica ( adorei isso!!)

6/26/2006 11:55:00 AM  
Anonymous Anônimo falou...

Olá Layla!
Lindo o blog, o inefável da Dança me capturou em pesquisas pela internet!
Gostaria de conversar melhor com vc, trocar mais sobre a Dança e a vida. Sou bailarina, psicóloga, mística, apaixonada pelo "Mulheres q correm com os Lobos" e outras coisas mais! Moro em Florianópolis atualmente, meu e-mail é: durgeeta@gmail.com
Beijo grande!
Mais uma vez parabéns!
Geeta

6/26/2006 02:14:00 PM  
Anonymous Anônimo falou...

Olá Layla!
Lindo o blog, o inefável da Dança me capturou em pesquisas pela internet!
Gostaria de conversar melhor com vc, trocar mais sobre a Dança e a vida. Sou bailarina, psicóloga, mística, apaixonada pelo "Mulheres q correm com os Lobos" e outras coisas mais! Moro em Florianópolis atualmente, meu e-mail é: durgeeta@gmail.com
Beijo grande!
Mais uma vez parabéns!
Geeta

6/26/2006 02:15:00 PM  
Anonymous Anônimo falou...

eu adoraria aprender essa dança.... mágica.

6/27/2006 12:35:00 AM  
Anonymous Anônimo falou...

Como tenho saudades desse Zaar, desse transe... Existem algumas danças combinadas com alguns momentos muito especiais em que me sinto dançando num cardume. A troca de energia anula a individualidade e surge o corpo coletivo, um único corpo, quente e pesado, que carrega todas nós, que carrega a dor de todas as mulheres. Isso é Zaar.

6/30/2006 03:25:00 PM  
Blogger Geeta da Luz falou...

Olá Layla, lembrei desta poesia de Gibran que recebi uma vez de outra bailarina, bem especial. Espero que goste.
“A DANÇARINA”
de Khalil Gibran

"Um dia, veio à corte do Príncipe de Birkasha,
uma dançarina e seus músicos.
...e ela foi aceita na corte...
e ela dançou a música da flauta, da cítara e do alaúde.
Ela dançou a dança das chamas e do fogo, a dança das espadas e das lanças; e ela dançou a dança das flores ao vento.
Ao terminar, virou-se para o príncipe e fez uma reverência. Ele então, pediu-lhe que viesse mais perto e perguntou-lhe: 'Linda mulher, filha da graça e do encantamento, de onde vem tua arte e como é que comandas todos os elementos em seus ritmos e versos?'
A dançarina aproximou-se, e curvando-se diante do príncipe disse: 'Majestade, respostas eu não tenho às vossas perguntas. Somente isso eu sei: a alma do filósofo vive em sua cabeça,
a alma do poeta vive em seu coração,
a alma do cantor vive em sua garganta,
mas a alma da dançarina habita em todo o seu corpo.'"

Compartilhei estas palavras outra vez com uma pessoa muito especial acrescentando: sinto que a alma habita todo o meu ser!
De todo o coração,
Geeta

7/01/2006 07:57:00 PM  
Anonymous Anônimo falou...

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7/02/2006 02:30:00 PM  
Blogger Layla falou...

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7/02/2006 07:34:00 PM  
Blogger Pawqar Waraq falou...

oiii,
realmente é logico o uso da metalinguagem quando se fala sobre si mesmo....legal voce colocar a dança como uma parte de voce ou melhor dizendo voce....Tambem amo a dança e estou trabalhando para considera-la parte de mim, nao faço
dança do ventro pratico dança livre, moderna e adoro...
Admiro a dança do ventre acho demais o controle com o corpo e a mensagem que passa para mim.....como uma especie de celebração a feminilidade como voce disse...

parabens pelo blog!

9/10/2006 04:34:00 PM  
Anonymous Anônimo falou...

Gostei muito do texto. Também sou fascinada pela dança e sinto algo muito próximo do que você descreveu. Parabéns!
P.S.: meu blog é exclusivamente sobre dança do ventre. Fique à vontade para visitar!

12/01/2006 01:08:00 PM  

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